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Caraguatatuba
28 Abril 2024

Flavia Pascoal volta a ser Prefeita de Ubatuba

A Prefeita Flavia Pascoal concedeu entrevista coletiva na tarde desta quarta-feira, dia 27, para falar sobre a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que determinou o seu retorno imediato à Prefeitura de Ubatuba. Flavia vai adiantar quais serão suas primeiras ações no retorno ao governo de Ubatuba.

 

Registro: 2024.0000252346

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2163131-20.2023.8.26.0000, da Comarca de Ubatuba, em que é agravante FLAVIA COMITTE DO NASCIMENTO, sendo agravada CÂMARA MUNICIPAL DE UBATUBA.

ACORDAM, em 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O         julgamento teve   a         participação          dos     Exmos. Desembargadores KLEBER LEYSER DE AQUINO (Presidente sem voto), JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA E MARREY UINT.

São Paulo, 26 de março de 2024.

PAOLA LORENA RELATORA Assinatura Eletrônica

Agravo de Instrumento nº 2163131-20.2023.8.26.0000

Agravante: Flavia Comitte do Nascimento

Agravada: Câmara Municipal de Ubatuba

Comarca: Ubatuba

Voto nº 11555

Agravo de instrumento. Demanda anulatória. Tutela de urgência. Pretensão de suspensão dos efeitos do Decreto Legislativo nº 01/2023, com imediata recondução da autora ao mandato eletivo, até final decisão no processo. Decreto Legislativo n° 01/2023 que cassou o mandato da

Prefeita do Município de Ubatuba, sob acusação de cometimento de infração político-

administrativa em licitação para aquisição de merenda escolar. Apuração no processo administrativo n° 139/2023. Alegação de ilegalidade no processo de cassação da exPrefeita. Acusações aparentemente inconsistentes. Justa causa para instauração não identificada suficientemente. Participação do Presidente da Câmara de Vereadores de Ubatuba na Comissão Processante, como relator do processo administrativo de cassação. Vedação do art. 14 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Ubatuba e do art. 5º, inciso II, do Decreto-Lei Federal nº 201/1967. Presença dos requisitos necessários à concessão de tutela de urgência, na forma do art. 300 do CPC. Recondução ao cargo político devida. Decisão reformada. Recurso provido.

 

 

Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Flavia Comitte do Nascimento em face de decisão lançada em ação anulatória de decreto legislativo ajuizada pela agravante contra a Câmara do Município de Ubatuba, pela qual foi indeferida a tutela de urgência pleiteada, voltada à suspensão dos efeitos do Decreto Legislativo nº 01/2023, com a imediata recondução da autora ao mandato eletivo, até final decisão no processo.

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Inconformada com a decisão interlocutória de

primeiro grau, postula a autora sua reforma e a atribuição de efeito ativo ao recurso. Para tanto, aduz o que segue: (I) serviram de fundamento para o decreto de cassação que se pretende anular suposta omissão da Prefeita na aquisição de pães que compunham a merenda escolar e falta de decoro; (II) nada de concreto teria sido apontado ao longo do processo administrativo de cassação que sugerisse falta de decoro; (III) inexistência de infração político administrativa da Prefeita; (IV) possibilidade de o Poder Judiciário analisar a existência ou não de justa causa para a abertura de um processo de cassação de mandato eletivo de Prefeito Municipal, sem que se configure invasão de competência do Poder Legislativo; (V) inexistência de irregularidade na aquisição de pão para compor a merenda escolar; (VI) ausência de justa causa, por inexistência de qualquer pagamento à empresa PASCOPAN; (VII)  não ter praticado qualquer ato no processo de licitação, mesmo porque existe instrumento de descentralização, utilizado para o certame questionado; (VIII) o processo de licitação que culminou com a contratação da ACF Fernaine foi conduzido pela Administração Municipal, por meio de cada setor e de cada servidor responsável, tais como a Secretaria de Educação, a Secretaria de Finanças, a Secretaria de Administração, a Comissão Permanente de Pregão, sem qualquer participação ou ingerência da Prefeita Municipal, ou de qualquer servidor sob suas ordens; (IX) já foi ouvida como vítima em inquérito policial que apura a prática de rachadinhas por parte de alguns vereadores da Câmara Municipal de Ubatuba, situação que teria motivado a abertura de processo de cassação; (X) impossibilidade de o Presidente da Câmara Municipal ser também o relator da comissão processante, por evidente interesse pessoal (art. 14, do Regimento Interno da Câmara Municipal de Ubatuba); (XI) nulidade da sessão de julgamento por cerceamento de defesa, pela não oitiva de testemunhas; (XII) após a cassação da agravante, a Mesa da Câmara Municipal enviou projeto de alteração da Lei Orgânica do Município, criando a figura das Emendas Impositivas de Vereadores.

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Às fls. 369/371, não foi atribuído o efeito ativo

postulado. Contra esta decisão, foi interposto agravo interno (autos nº 2163131-20.2023.8.26.0000/50000).

Contraminuta às fls. 383/389.

Às fls. 488/492, foi determinada a redistribuição livre

dos autos.

Parecer da Procuradoria de Justiça pelo não

provimento do recurso (fls. 505/512).

Por conexão entre a ação anulatória e mandados de

segurança anteriores, com recursos interpostos apreciados por esta 3ª Câmara de Direito Público, a 2ª Câmara de Direito Público deste Tribunal de Justiça determinou a devolução dos autos, por considerar caracterizada a prevenção, em aplicação ao disposto no artigo 105 do Regimento Interno desta E. Corte (fls. 522/529 e fls. 728/734).

Novas manifestações da ex-Prefeita às fls. 741/753,

com os documentos de fls. 754/760 e às fls. 762/771.

É o relatório.

 

A questão posta em juízo e trazida à apreciação

desta Câmara diz respeito a pretensão de suspensão dos efeitos do Decreto Legislativo nº 01/2023, com a imediata recondução da autora, ora agravante, ao mandato eletivo de Prefeita do Município de Ubatuba, até decisão final no processo.

O deferimento da tutela de urgência, na forma

disciplinada pelo artigo 300 do Código de Processo Civil, pressupõe a presença dos seguintes requisitos: a probabilidade do direito e o perigo de dano, ou risco ao resultado útil do processo.

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Neste momento, deve prosperar a irresignação.

A respeito da possibilidade de intervenção do Poder Judiciário em procedimentos legislativos, o Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de admiti-la somente para assegurar o cumprimento da Constituição, proteger direitos fundamentais e resguardar os pressupostos de funcionamento da democracia e das instituições republicanas. […] Em se tratando de processos de cunho acentuadamente político, como é o caso da cassação de mandato parlamentar, a Corte deve se pautar pela deferência e pela autocontenção, somente intervindo em casos excepcionalíssimos. (sic. MS 34327, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 08-09-2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-168  DIVULG 31-07-2017  PUBLIC 01-08-2017).

Em     harmonia     com     a     jurisprudência     da     Corte

Constitucional, o Superior Tribunal de Justiça adota posicionamento segundo a qual não é possível a análise do mérito da decisão de casa legislativa em processo de cassação de parlamentar, tendo em vista se tratar de ato interna corporis. A propósito, transcreve-se o julgado:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISCUSSÃO DE TESE NÃO APRECIADA PELA CORTE DE ORIGEM. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. CASSAÇÃO DE

MANDATO DE VEREADOR. IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO ANALISAR O MÉRITO DO ATO DA CASA

LEGISLATIVA.

  1. O Tribunal de origem não se manifestou sobre a alegação de que “a cassação do mandato do ora Recorrente pela conduta de suposto nepotismo, fez-se absolutamente teratológica, vez que, conforme ressoa dos autos, o mesmo jamais incorreu em tal prática”, tampouco foram opostos embargos declaratórios para suprir eventual omissão.

Portanto, à falta do necessário prequestionamento, incide o óbice da Súmula 282/STF.

  1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça aponta para a impossibilidade de se analisar o mérito de

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decisão de casa legislativa em processo de cassação de parlamentar, tendo em vista se tratar de ato interna corporis, cabendo ao Poder Judiciário analisar apenas os aspectos atinentes à observância do devido processo legal, com a abertura de contraditório e oportunidade de ampla defesa.

  1. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp n. 853.247/MG, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 24/5/2016, DJe de 2/6/2016.)

Fixadas essas premissas, passa-se à análise do mérito

recursal.

No caso concreto destes autos, há elementos de

prova que apontam a alegada inexistência de justa causa para a instauração de procedimento administrativo de cassação do mandato eletivo da requerente, outrora Prefeita Municipal de Ubatuba. Isso porque, em análise preliminar, a prova dos autos aponta para nenhuma participação direta da então Prefeita no processo licitatório  pregão eletrônico  que, supostamente, teria favorecido seus familiares. Tampouco restou evidenciada a suposta omissão por parte da Chefe do Executivo Municipal.

A bem da verdade, sequer foi descrita a alegada

omissão da então Prefeita, tampouco a conduta eivada de falta de decoro, seja no processo de licitação, seja depois da aquisição de pães da PASCOPAN pela empresa ACF FERNAINE COMÉRCIO DE SERVIÇOS LTDA.

Em outras palavras, não se descreveu qual deveria ter

sido a atuação da Prefeita diante da situação que se desenhou e que teria deixado de ser levada a efeito.

Por outro lado, a prova dos autos indica que a

autora/recorrente não atuou no processo de licitação e que neste, não houve participação da empresa PASCOPAN, de titularidade do irmão  da Prefeita. A empresa que participou do certame e logrou contratar com a Prefeitura foi a ACF FERNAINE COMÉRCIO DE

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SERVIÇOS LTDA. A PASCOPAN era um dos fornecedores da empresa ACF FERNAINE.

Ainda no que toca ao processo administrativo de

cassação, a participação do Presidente da Câmara Municipal na Comissão Processante (fl. 40) realmente é vedada pelo Regimento Interno da Câmara Municipal de Ubatuba, em seu artigo 14, que assim dispõe (grifo nosso):

 

Art. 14. Dos membros da Mesa em exercício, apenas o Presidente não poderá fazer parte das Comissões.

Quanto ao Decreto-Lei Federal nº 201/1967, que trata

dos crimes de responsabilidade, infrações político-administrativas, extinção de mandatos e processos de cassação dos Prefeitos Municipais e Vereadores,  assim dispõe em seu artigo 5º, inciso III, sobre o processo administrativo para cassação do Prefeito Municipal pela Câmara (grifos nossos):

Art. 5º. O processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito, se outro não for estabelecido pela legislação do Estado respectivo:

  • […]
  • De posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o seu recebimento. Decidido o recebimento, pelo voto da maioria dos presentes, na mesma sessão será constituída a Comissão Processante, com três Vereadores sorteados entre os desimpedidos, os quais elegerão, desde logo, o Presidente e o Relator.
  • […]
  • […]
  • […]
  • […]
  • […]

[…]

Das disposições transcritas, verifica-se que o Presidente da Câmara  Vereador Eugênio Zwibelberg  sequer poderia ter participado do sorteio para composição da Comissão

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Processante. Não só participou, todavia, como foi relator do processo (fl. 40).

Nessa linha, mostra-se presente o requisito da

probabilidade do direito invocado  o fumus boni juris  para a concessão da tutela de urgência, para vigorar provisoriamente.

Vale acrescentar que, na profundidade, as alegações

de ausência de comportamentos que configurem falta de decoro ou omissão, legalidade do processo licitatório e falta de oitiva de testemunhas no processo administrativo são matérias que demandam exame mais acurado da prova, a fim de que seja aquilatada a higidez do processo de cassação. Essa apreciação deverá ser feita na origem, pela MMª Juíza da causa, na oportunidade própria.

Noutro giro, evidente o periculum in mora, na medida

em que a gestora está afastada das funções inerentes ao mandato popular que lhe foi conferido.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso e o faço

para suspender os efeitos do Decreto nº 01/2023 da Câmara Municipal de Ubatuba e por consequência, determinar a recondução da agravante ao cargo de Prefeita Municipal, pelo período restante do mandato para o qual foi eleita, até decisão final.

 

PAOLA LORENA

Relatora